quinta-feira, 15 de abril de 2010

A noite é feminina; mais delicada que o áspero dia. A noite inspira quietude e nos envolve de recato.

Sou seu H.I.V.



Divirta-se!
No seu momento de distração,
Transcendência, gozo e alucinação.
Sutilmente penetro na sua fortaleza
Injeto meu vírus. Aí, que beleza!
Demoro um tempo para ser percebida
Quando perceber já estou acabando com a sua vida
Vou acabando com sua imunidade
Como corda vou amarrando seus braços
Deixando-te sem mobilidade
Seus glóbulos vou matando sem piedade
Sou poeta destruidora de alienação
Saudando minha ancestralidade
Combatente, militante contra a padronização.
Onde diz que a loira é bonita
E que o feio está em mim
Enganou-se, pois, sou descendente de Zumbi
Resistente que nem Anastácia
Liderança feminina feita a Dandara
Posso organizar um esquadrão
De talentos marginalizados assim como Luiza Mahin
Na revolta do Malês linha de frente
Posso me incorporar com marinheiro
Dominando as náuticas João Cândido guerreiro
Ainda continuamos nos porões
Lixo, esgoto, escravidão e senzala
São heranças que nos foram deixadas
Iguais a mim existem vários na missão
Organizando-se, se armando de informação.
Para vocês somos algo negativo
Como o vírus do HIV no organismo
Cada dia mais vamos nos fortificando e se proliferando
Somos veneno e não temos antídoto
Espalharemos a destruição
Destruiremos essa herança escravocrata
Estrutura capitalista, racista, exploradora, deturpada.
Ah! Se achar que acabou se prepare.
Pois agora irá ouvir o que nos tem fortificado
Foi o seqüestro que me trouxe a esse continente
A condição desumana que fui transportada junto aos dejetos
Os estupros como se eu fosse um animal
Os ferrões no meu corpo simbolizando que agora eu era seu objeto
Seu brinquedo vivo de certo
Sou nascida de sangue, suor, lágrimas
Acuada, desprotegida como rato na frente de um gato
Minha religião foi amaldiçoada, e a sua dizia que eu não tinha alma
Dominaram minha língua e impuseram a de vocês
Como se a minha nada representasse
Meus seios cheios de leite por seus filhos eram sugados
Enquanto os meus bebês morriam de fome e maus tratos
E assim fui nutrida com a ajuda dos orixás
Resisti até aqui no século XXI
Sendo que na minha casa falta o pão
Na infância faltaram-me os brinquedos para a diversão
Fui crescendo alimentada pelo descaso
Pela fome, pela negação de oportunidades
Sem políticas públicas, sem escola, sem faculdade
Hoje quero reparação, mesmo que não apague as chicotadas
Quero vida decente para a futura geração
Sei que vocês continuam se achando superiores
Mas não se esqueça que sou seu HIV
Estou entrando devagarzinho e levarei aos poucos
Tudo que nos foi roubado.
[MJIBA]

quarta-feira, 14 de abril de 2010

DO AMOR



Não falo do amor romântico,
aquelas paixões meladas de tristeza e sofrimento.
Relações de dependência e submissão,
paixões tristes.
Algumas pessoas confundem isso com amor.
Chamam de amor esse querer escravo,
e pensam que o amor é alguma coisa que pode ser definida,
explicada, entendida, julgada.
Pensam que o amor já estava pronto,
formatado, inteiro, antes de ser experimentado.
Mas é exatamente o oposto, para mim,
que o amor manifesta.
A virtude do amor é sua capacidade potencial de ser construído,
inventado e modificado.
O amor está em movimento eterno, em velocidade infinita.
O amor é um móbile.
Como fotografá-lo?
Como percebê-lo?
Como se deixar sê-lo?
E como impedir que a imagem sedentária e cansada do amor não nos domine?
Minha resposta?
O amor é o desconhecido.
Mesmo depois de uma vida inteira de amores,
o amor será sempre o desconhecido,
a força luminosa que ao mesmo tempo cega e nos dá uma nova visão.
A imagem que eu tenho do amor é a de um ser em mutação.
O amor quer ser interferido,
quer ser violado,
quer ser transformado a cada instante.
A vida do amor depende dessa interferência.
A morte do amor é quando, diante do seu labirinto,
decidimos caminhar pela estrada reta.
Ele nos oferece seus oceanos de mares revoltos e profundos,
e nós preferimos o leito de um rio,
com início, meio e fim.
Não, não podemos subestimar o amor não podemos castrá-lo.
O amor não é orgânico.
Não é meu coração que sente o amor.
É a minha alma que o saboreia.
Não é no meu sangue que ele ferve.
O amor faz sua fogueira dionisíaca no meu espírito.
Sua força se mistura com a minha e
nossas pequenas fagulhas ecoam pelo céu
como se fossem novas estrelas recém-nascidas.
O amor brilha.
Como uma aurora colorida e misteriosa,
como um crepúsculo inundado de beleza e despedida,
o amor grita seu silêncio e nos dá sua música.
Nós dançamos sua felicidade em delírio porque somos o alimento preferido do amor,
se estivermos também a devorá-lo.
O amor, eu não conheço.
E é exatamente por isso que o desejo e me jogo do seu abismo,
me aventurando ao seu encontro.
A vida só existe quando o amor a navega.
Morrer de amor é a substância de que a Vida é feita.
Ou melhor, só se Vive no amor.
E a língua do amor é a língua que eu falo e escuto.

domingo, 11 de abril de 2010

8891-3953